O que pensa a agropecuária brasileira sobre o Green Deal europeu?

Produtores têm mais críticas e sugestões do que preocupação com novas exigências

O que pensa a agropecuária brasileira sobre o Green Deal europeu?
24deMaiode2024ás15:04

A produção agropecuária brasileira tem relevância global por seu volume e variedade, mas também é frequentemente apontada por questões ambientais.

Por isso, o país seria um dos principais atingidos pelo Pacto Verde Europeu, também chamado Green Deal ou Lei Antidesmatamento, que amplia restrições a produtos cultivados em áreas desmatadas.

Mas, a produção brasileira é realizada em áreas desmatadas? Uma resposta justa a esta questão exige mais que informações descontextualizadas ou narrativas para ganhar votos de eleitores pouco informados sobre o assunto.

O primeiro ponto importante é a própria legislação brasileira sobre o tema, o Código Florestal Brasileiro, que é uma das mais rigorosas do mundo.

Para se ter ideia, os agricultores e pecuaristas brasileiros são obrigados por lei a preservar grandes percentuais da vegetação nativa dentro de suas propriedades segundo a localização no país.

Os fazendeiros com áreas no Bioma Amazônico, por exemplo, têm exigência de manter a cobertura original em 80% de suas propriedades. Em seus 851 milhões de hectares, o Brasil tem outros biomas, como o Cerrado, Caatinga, Pantanal, Mata Atlântica e Pampas, nos quais o percentual varia entre 50% e 20%.

“O produtor brasileiro tem o código florestal mais moderno e mais restritivo do mundo. Grande parte território brasileiro tem cobertura original e é preservado por áreas de proteção florestal, reservas indígenas e outras unidades de conservação, especialmente no Bioma Amazônico”, diz Lucas Costa Beber, presidente da Aprosoja-MT (Associação dos Produtores de Soja e Milho do Mato Grosso).

Então, imagine um produtor que preserva 80% de sua propriedade privada recebendo a acusação de ser um desmatador, apenas por estar no bioma Amazônico, que ocupa 49,2% do Brasil. Isso significa 419 milhões de hectares, o suficiente para quase 70% de toda a Europa sem a Rússia.

O detalhe é que o Código Florestal distingue desmatamento legal e desmatamento criminoso. Este ponto é relevante porque, no entendimento dos agricultores brasileiros, as novas exigências europeias são arbitrárias por não considerar esta diferenciação, já que estipulam 30 de dezembro de 2020 como data limite para abertura de qualquer nova área.

Qual seria o impacto para o Brasil?

A Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento do Brasil estima que o Green Deal europeu poderia impactar 34% dos produtos agropecuários exportados pelo Brasil para a União Europeia em 2022.

No mesmo ano, as exportações brasileiras para o bloco a movimentaram US$ 25,6 bilhões, de US$ 159 bilhões das vendas internacionais do setor, o que representa 16% do total.

Em receita, a soja liderou em 2022, correspondendo a 34,5%. A oleaginosa foi seguida por café (17,5%) e segmento de florestais (12,8%). Entre os outros itens, estão carne bovina, cacau, óleo de palma, borracha e derivados. Apenas no caso da soja, o impacto poderá ser bilionário.

“O Brasil exporta para a União Europeia US$ 3,3 bilhões (6,1 milhão ton) de soja em grãos e US$ 5,3 bilhões (10,3 milhões de ton) de farelo. O risco é de perder parte desse volume de exportação”, dimensiona André Nassar, presidente-executivo da Abiove (Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais).

De acordo com ele, o setor de óleos vegetais cumpre a lei brasileira integralmente e exporta soja e farelo e óleo sem desmatamento. “Por que há risco então? Porque nem a Comissão Europeia, nem os órgãos de inspeção e fiscalização dos países membros reconheceram os processos e controles que nosso setor faz como válidos”, explica.

Sr. Nassar reconhece que a legislação tem motivação nobre e correta, mas vai criar custos de transação na cadeia de suprimentos de alimentos. Para ele, foi uma lei elaborada e votada sem qualquer preocupação com impacto nas cadeias de suprimento.

“Nesse sentido, trata-se de uma legislação com algum grau de irresponsabilidade do legislador europeu. Deveria ter restringido as obrigações às questões de legalidade e desmatamento ilegal, mas foi além”, analisa.

Ainda assim, o Sr. Lucas não considera as novas exigências uma preocupação.